(!) Por TJGuimarães
O JOVEM TEM TODOS OS DEFEITOS DO ADULTO E MAIS UM: O DA IMATURIDADE!
Nelson Falcão Rodrigues, pernambucano, mas criado na Cidade do Rio de Janeiro no Bairro Aldeia Campista (Zona Norte) desde os 5 anos. A imaginação fértil do futuro escritor, contista, cronista, jornalista e dramaturgo, a realidade da Zona Norte carioca, com suas tensões morais e sociais, serviu como fonte de inspiração para Nelson construir personagens memoráveis e histórias carregadas de lirismo trágico.
Lado a lado com o teatro, o jornalismo foi para ele um ambiente privilegiado de expressão. Dentre seus textos propriamente jornalísticos, destacam-se aqueles dedicados ao futebol, transformando partidas em verdadeiras batalhas épicas e seus jogadores em heróis. Trabalhou nos mais diversos jornais e revistas e também na televisão, com artigos, crônicas e entrevistas. Sua coluna que ficou muito popular no jornal Última Hora foi “A Vida Como Ela É…”.
Machista, tarado, reacionário, etc. Estes são apenas alguns dos adjetivos atribuídos a Nelson Rodrigues. Porém, independentemente da opinião daqueles que ajudaram a construir esta visão tão pejorativa, ele é considerado o primeiro a colocar no palco a vida cotidiana (como ela é) do subúrbio carioca, abrindo caminho para o uso coloquial da língua e inovando as temáticas dos textos teatrais.
Seus textos e caricaturas contra ídolos da esquerda, durante a ditadura militar, eram impagáveis até o dia em que prenderam e torturaram o seu filho Nelsinho (Nelson Rodrigues Filho), que era um militante terrorista. Após esse evento, Nelson Rodrigues revisou seus posicionamentos e militou pela anistia “ampla, geral e irrestrita” aos presos políticos de então.
Considerado como um dos mais importantes dramaturgos brasileiros, ele nos deixou 17 obras teatrais que, por acaso adentrou em sua vida por necessidades financeiras. Ademais de centenas de contos, crônicas e nove romances.
Bem, agora que falamos sobre o criador, vamos conhecer em rápidas pinceladas um dos mais importantes textos do teatro brasileiro: O Beijo no Asfalto, que alavanca ainda mais a carreira desse dramaturgo.
O Beijo no Asfalto é uma peça de Nelson Rodrigues que insiste em não envelhecer. Passadas quase seis décadas, essa peça se mantém como a mais contemporânea das tragédias desse dramaturgo. Seja nos tempos da imprensa sensacionalista, das fofocas de portão ou das redes sociais.
Além das temáticas características do autor, como repressão social, moral, hipócrita e incestos, o drama mostra uma vida destruída por um jornal. Ao retrato da imprensa sensacionalista, mistura-se a análise do comportamento abusivo de alguns policiais.
Inspirado nem uma história real com algumas adaptações, O beijo no asfalto foi muito elogiado pela crítica após sua publicação em 1960. É composto por três atos e treze quadros. Foi adaptado três vezes para filmes e ainda para quadrinhos e tem também uma versão musical. É uma peça teatral escrita por Nelson Rodrigues em 1960, especialmente para o Teatro dos Sete. No ano de 1961 foi encenada por Fernanda Montenegro, Sérgio Britto, Ítalo Rossi, Fernando Torres, Oswaldo Loureiro, Suely Franco, entre outros.
A trama acontece a partir de um atropelamento no centro da cidade do Rio de Janeiro, em 1961. Um homem jovem é atingido por uma lotação e morre no local. Mas na hora da morte, um dos transeuntes segura seu rosto e lhe dá um beijo. E a partir daí a circulação de notícias falsas transforma a vida deste homem, Arandir, em um verdadeiro inferno ao mesmo tempo em que mostra como são frágeis os princípios que norteiam a nossa sociedade e a “tradicional” família brasileira.
O mote é a respeito de um ato misericordioso (um beijo na boca dado a um homem por outro homem na hora de sua morte) e suas repercussões na sociedade. Um repórter sensacionalista e um delegado corrupto fazem do ato um escândalo social, abalando a reputação de Arandir, que diz ter atendido ao pedido do moribundo, levando a uma exacerbação dos sentimentos que conduz a um trágico e surpreendente desfecho.
O Beijo no Asfalto é uma tragédia contemporânea, onde o enredo pode ser caracterizado como simples, porém os acontecimentos são surpreendentes e nada convencionais. Nelson Rodrigues utiliza uma linguagem usual, que é empregada para ser falada pelos atores representantes. Nos diálogos, há muitas interrupções na fala; esses cortes são recorrentes da língua falada, e na obra, são escritas. Como não há narrador, só diálogos, a obra é muito dinâmica e permeada de ações. Entretanto, fica impossível o leitor conhecer o que passa de sentimentos e percepções nos personagens no desenrolar da trama.
Arandir é o personagem principal e que sofre uma intensa transformação. Não por sua culpa ou vontade, mas por maldade e preconceitos alheios. Ao beijar a boca do morto, Arandir deixa de ser visto como na realidade é – um homem honesto, trabalhador, bom marido – e passa a ser tachado como homossexual e criminoso, e fica a se esconder, solitário. Para ele, o beijo foi um sinal de caridade, de amor e de compaixão ao próximo, sem ter outra saída, fez o bem a um desconhecido. Para a sociedade hipócrita, corrupta e preconceituosa, não há lugar para bons sem sentimentos sem haver nada em troca. Seria, assim, impossível um homem dar um beijo em outro homem apenas por sinal de amizade ou piedade? Os demais personagens não aceitam a história de Arandir e se unem para cada vez mais provar que ele já conhecia o morto e forma-se uma verdadeira conspiração com conotações homofóbicas contra o personagem principal, Arandir.
Nos finalmentes da trama e, para despistar os jornalistas e a polícia, Arandir se hospeda num hotel e pede para que Selminha vá visita-lo. Selminha não vai e manda Dália para dar o recado. Chegando lá, Dália dá o recado e declara seu amor por Arandir, que o recusa. Aprígio aparece no hotel e flagra os dois numa conversa íntima, saca um revólver e mata Arandir, declarando seu amor secreto e seu ciúme por ele. Bem, se depreende que o homossexual é o Aprígio e não Arandir.
(!) Historiador, Jornalista, Professor de História/Geografia/Sociologia/Filosofia