(*) Por TJGuimarães
SOLDADOS DA BORRACHA – A FLORESTA PEDE SOCORRO; O HOMEM TAMBÉM
Antes, por favor, leia a primeira parte que disserta sobre o contexto vivenciado por Chico Mendes, família e companheiros: Látex, Ciclo da Borracha, Seringueira, Seringal e Seringueiro. Enfim, o contexto da haveicultura.
CHICO MENDES, Seringueiro, sindicalista, ambientalista e ativista político brasileiro. Durante a sua existência lutou a favor dos Seringueiros da Bacia Amazônica, cuja subsistência dependia da preservação da floresta e dos Seringais Nativos. Seu ativismo lhe trouxe reconhecimento internacional, mas ao mesmo tempo provocou a ira dos grandes fazendeiros locais.
Para ele, a prática do “Empate” começou em 1976. Chico Mendes viveu essa experiência à frente das motosserras de madeireiros e fazendeiros, tentando evitar, juntamente com parceiros, amigos e parentes, o desmate de áreas de seringais na região de Xapurí – Acre.
Indignado e já cansado com as condições de vida dos trabalhadores e dos moradores da região amazônica, tornou-se um líder do movimento de resistência pacífica. Defensor da floresta e dos direitos dos Seringueiros, ele organizou os trabalhadores para protegerem o ambiente seringueiro, suas casas e famílias contra a violência e a destruição comandada pelos madeireiros e fazendeiros, ganhando apoio internacional.
Iniciou o movimento sindical no Acre em 1975, criando o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia. Participando ativamente das lutas dos seus companheiros para impedir os desmatamentos, montou também o Conselho Nacional de Seringueiros, uma organização não-governamental criada para defender as condições de vida e trabalho das comunidades que dependem da floresta.
Além disso, Chico Mendes também atuou na luta pela posse da terra contra os grandes proprietários, algo impossível de se pensar na região amazônica até os dias de hoje. Dessa forma, entrou em conflito com os donos de madeireiras, de seringais e de fazendas de gado. Mendes ganhou uma lista de inimigos. Mesmo assim, passou a mobilizar os Seringueiros por uma luta não violenta. A organização de barricadas humanas para impedir a derrubada de árvores, conhecidas como “Empates”, ganharam visibilidade dentro e fora do país.
Participou da fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, em 1977, e foi eleito vereador para a Câmara Municipal local, pelo MDB, único partido de oposição permitido pela ditadura militar que governava o país (1964-1985). Foi nessa época que Chico começou a sofrer as primeiras ameaças de morte por parte dos fazendeiros. Ao mesmo tempo, começou a enfrentar vários problemas com o seu próprio partido: o MDB que não era solidário às suas lutas de sustentabilidade da floresta.
Em 1979, o vereador Chico Mendes lotou a Câmara Municipal local com debates entre lideranças sindicais, populares e religiosas a respeito da defesa da floresta e a inoperância dos poderes constituídos. Pela data, é bom lembrar que era o tempo da ditadura militar. Foi acusado de subversão e passou por interrogatórios nada suaves. Foi torturado de forma secreta e, como estava sozinho nessa luta, não podia denunciar o fato, ou seria poderia ser morto.
Foi assim, em busca de sustentação política para a sustentabilidade da floresta, que decidiu ajudar a criar o Partido dos Trabalhadores (PT), tornando-se seu dirigente nesse Estado, o Acre. Um ano depois de ser torturado, foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional, acusado de ter participado da morte de um fazendeiro na região que assassinara o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Brasiléia.
Quando liderou o Encontro Nacional dos Seringueiros, em 1985, a luta dos seringueiros começou a ganhar repercussão mundial. Sua proposta de “União dos Povos da Floresta“, apresentada na ocasião, pretendia unir os interesses de índios e Seringueiros em defesa da floresta amazônica. Seu projeto incluía a criação de reservas extrativistas para demarcar e preservar áreas indígenas, a floresta e a garantia de reforma agrária para beneficiar os Seringueiros.
Transformado em símbolo da luta para defender a Amazônia e os povos da floresta, Chico Mendes recebeu a visita de membros da UNEP (órgão do meio ambiente ligado à Organização das Nações Unidas), em Xapuri, em 1987. Lá, os inspetores viram a devastação da floresta e a expulsão dos Seringueiros, tudo feito com dinheiro de projetos financiados por bancos internacionais.
Logo em seguida, o ambientalista e líder sindical foi convidado a fazer essas denúncias no Congresso norte-americano. O resultado dessa viagem a Washington foi imediato. Em um mês, os financiamentos aos projetos de destruição da floresta foram suspensos. Chico foi acusado na imprensa por fazendeiros e políticos envolvidos no negócio de prejudicar o “progresso do Estado do Acre“.
Em contrapartida às denúncias e perseguições, recebeu vários prêmios e homenagens no Brasil e no mundo, como uma das pessoas de mais destaque na defesa da ecologia, da floresta e a sua sustentabilidade.
Chico, conseguiu realizar alguns de seus sonhos, ao assistir à criação das primeiras reservas extrativistas no Estado do Acre. Também conseguiu a desapropriação do Seringal Cachoeira, de Darly Alves da Silva, seu algoz, em Xapuri. Foi quando as ameaças de morte se tornaram mais violentas e frequentes: Chico denunciou o fato às autoridades, deu nomes aos bois, pediu proteção policial, mas nada conseguiu.
Pouco mais de um ano após sua ida ao Senado dos Estados Unidos, o ativista acabava de completar 44 anos quando foi assassinado no quintal de sua casa, em Xapuri, com um tiro no peito – 1988. Em 1990, o fazendeiro Darly Alves da Silva e seu filho, Darci Alves Pereira, foram julgados e condenados a 19 anos de prisão, pela sua morte – que cumpriram até 2010. Em dezembro de 2013, 25 anos após seu assassinato, Chico Mendes foi declarado Patrono Nacional do Meio Ambiente.
Um dos mais importantes institutos brasileiros de preservação do meio ambiente homenageia Francisco Mendes Filho no nome não por acaso. Imortalizada no ICMBio, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Assim, a luta de Chico Mendes pela preservação das florestas, reforma agrária e proteção das terras indígenas repercute em todo o mundo até os dias de hoje.
Em dezembro de 2008, 20 anos depois de sua morte, por decisão do Ministério da Justiça, publicada no Diário Oficial da União de 11 de fevereiro de 2009, Chico Mendes foi anistiado em todos os processos de subversão que corriam contra ele e sua viúva Ilzamar Mendes.
Chico Mendes acreditava que a melhor forma de cuidar e conservar o meio ambiente e a Amazônia era a partir da criação de reservas extrativistas de culturas nativas como o babaçu, ervas medicinais, borracha, guaraná e castanhas. No entanto, suas ideias iam de confronto aos interesses dos madeireiros, grandes fazendeiros e pecuaristas da época que devastam a floresta da região até hoje. Mesmo com diversos inimigos, Mendes nunca se intimidou com as ameaças que sofreu.
EPÍLOGO – No coração da maior floresta do mundo, os últimos Seringueiros do Brasil buscam continuar vivendo do extrativismo, mesmo com a constante desvalorização do látex. Hoje, as dificuldades ainda são imensas. Ameaçados pelos mesmos personagens de sempre, os Seringueiros do Acre ainda sofrem as mesmas e outras intimidações o tempo todo. A luta pela terra neste rincão escondido do país gera mortes, despedaça famílias, expulsam e /ou mantém os seringueiros em constante estado de alerta. O sonho de envelhecer vivendo na floresta é uma batalha diária, que já vitimou pessoas simples e líderes, como Wilson Pinheiro e Chico Mendes.
O assassinato de Chico Mendes, em Xapuri, em 1988, foi o estopim para que as reivindicações dos povos da floresta chegassem ao poder público. Porém, 28 anos depois, o que se vê é o abandono de muitos projetos e cooperativas idealizadas pelo líder dos Seringueiros. Com o látex pouco lucrativo, os extrativistas buscam novas formas de sustentação. Plantações de cacau e produção de castanha para exportação são atividades que garantem a sobrevivência dos acreanos que ainda resistem.
Resistir parece ser o verbo correto para se pronunciar no Estado de Acre. Assim como os extrativistas, a floresta resiste às ações de madeireiras e criadores de gado. Oficialmente, todos os “agentes” estranhos à floresta dizem fazer o manejo sustentável das áreas exploradas. Na prática, é visível que o desmatamento ilegal da vegetação amazônica aumentou nos últimos anos. Nada mais distante do ideal que Chico Mendes tinha para a região, onde os trabalhadores, reunidos em cooperativas, conseguiriam a sobrevivência respeitando os limites da floresta.
A força do trabalho de Chico Mendes se vê nas incontáveis homenagens prestadas a ele, são reservas, estátuas, bustos, institutos e parques espalhados por todo o Brasil que levam seu nome, além de prêmios internacionais como o Global 500, oferecido pela Organização das Nações Unidas (ONU), por sua luta em defesa do meio ambiente. Abaixo relacionamos alguns parques em sua homenagem.
Parque ecológico Chico Mendes em São Paulo – Com churrasqueiras, quadras de futebol, trilhas, nascentes, córrego e lago. O parque, aberto ao público em 1989, é definido como de uso cultural, de lazer e também voltado para pesquisa e conhecimento do meio ambiente.
Parque Chico Mendes em Porto Alegre – O Parque fica na zona norte de Porto Alegre, e oferece opção de descanso e lazer acessível à população da região. Calcula-se que o parque beneficie diretamente cerca de 200 mil pessoas. O espaço possui o memorial Chico Mendes e o anfiteatro ao ar livre se destinam a cerimônias oficiais e programação cultural, como shows músicas e peças teatrais. A denominação é uma homenagem que a prefeitura de Porto Alegre presta ao ambientalista, chamado pelo órgão como um cidadão brasileiro, símbolo de dignidade e respeito ao ambiente.
Reserva Extrativista Chico Mendes no Acre – Na reserva que fica na cidade do ativista ambiental ainda é feita a exploração e comercialização de borracha e de óleo de copaíba. Além dessas atividades, a comunidade faz o manejo madeireiro comunitário e familiar.
A população local estabeleceu uma parceria com a Secretaria de Esporte, Turismo e Lazer do Estado do Acre, visando a implantação de uma trilha ecológica na Unidade de Conservação, com foco no turismo.
Instituto Chico Mendes – O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) é uma autarquia em regime especial vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e foi criado no dia 28 de agosto de 2007. Cabe a ele o uso público e a exploração econômica dos recursos naturais nas Unidades de Conservação. Na área de pesquisa, a instituição contribui para a geração e disseminação sistemática de informações e conhecimentos relativos à gestão de Unidades de Conservação, da conservação da biodiversidade e do uso dos recursos faunísticos, pesqueiros e florestais.
(*) Historiador, Jornalista, Professor de História/Geografia/Sociologia/Filosofia