(!) Por TJGuimarães
Na Canção do Exílio, Gonçalves Dias, cantava a saudade que sentia do Brasil, e descrevia as belezas de sua terra, no momento da recém adquirida independência de Portugal. Ele encontrava-se em um exílio físico e geográfico, já que ao escrever este poema, ele estava em Coimbra, cursando Direito.
Jô Soares, transforma em poesia os escândalos do governo do então presidente da República, Fernando Collor, nos anos finais do século XX (1990-1992). O poema de Jô trata da situação política do Brasil, ano do impeachment de Collor. Ele de modo crítico e bem humorado fala dos confortos, regalias e modernidades desfrutadas e do horror que o eu-lírico (Collor), tem de voltar á sua terra, Alagoas. Ele cantava a boa vida que levava na casa da Dinda, sua residência na época. – Podemos dizer que esses dois textos são um clássico exemplo de intertextualidade. Chamamos intertextualidade quando um texto faz referências a outro texto de modo implícito ou explicito.
Uma das formas de intertextualidade é a que apresentamos aqui: a paródia.
Paródia é a recriação de um texto de um ponto de vista crítico. Embora conserve as mesmas ideias do texto base, adiciona um tom jocoso, engraçado a ele.
Bahktin afirma que “Todas as palavras e formas que povoam a linguagem são vozes sociais e históricas…” (1981:78) E podemos observar essas “vozes sociais e históricas” em ambos os textos acima mencionados. Tanto Gonçalves Dias quanto Jô Soares procuraram apresentar o seu ponto de vista e deixar as suas impressões da realidade que acontecia nos seus dias, no contexto político, social, cultural e filosófico.
A paródia, entretanto, tem como meta levar o leitor a uma reflexão crítica do que acontece no País, suas perdas, e a busca de meios para corrigir as injustiças que ocorrem. O objetivo é informar de modo irreverente e ajudar a formar leitores reflexivos e politizados.
Em tempos de CPI, conluios, conchavos, leniência, corrupção e a persistência da velha política, nada como esta versão da CANÇÃO do EXÍLIO de Jô Soares.
É uma aluzão aos jardins de sua casa – da dinda – em Brasília quando era presidente do Brasil, isto em 1982 a 1984, quando ele, Collor, tentava justificar a dinheirama que manipulava.
Minha Dinda tem cascatas onde canta o curió
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Minha Dinda tem coqueiros
Da ilha de Marajó
As aves, aqui, gorjeiam não fazem cocoricó.
O meu céu tem mais estrelas
Minha várzea tem mais cores.
Este bosque reduzido
Deve ter custado horrores.
E depois de tanta planta,
Orquídea, fruta e cipó
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Minha Dinda tem piscina,
Heliporto e tem jardim
Feito pelas Brasil’s Garden
Não foram pagos por mim.
Em cismar sozinho à noite
Sem gravata e paletó
Olho aquelas cachoeiras
Onde canta o curió.
No meio daquelas plantas
Eu jamais me sinto só.
Não permita Deus que eu tenha de voltar pra Maceió.
Pois no meu jardim tem lago
Onde canta o curió
E as aves que lá gorjeiam
São tão pobres que dão dó.
Minha Dinda tem primores de floresta tropical
Tudo ali foi transplantado
Nem parece natural.
Olho a jabuticabeira
Dos tempos da minha avó.
Não permita Deus que eu tenha de voltar pra Maceió.
Até os lagos das carpas
São de água mineral.
Da janela do meu quarto
Redescubro o Pantanal
Também adoro as palmeiras
Onde canta o curió
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Finalmente, aqui na Dinda,
Sou tratado a pão-de-ló
Só faltava envolver tudo
Numa nuvem de ouro em pó.
E depois de ser cuidado
Pelo PC com xodó,
não permita Deus que eu tenha de voltar pra Maceió.
(!) Historiador, Jornalista, Professor de História/Geografia/Filosofia/Sociologia