O PAGADOR DE PROMESSAS – PALMA DE OURO QUE ELE MERECE! INOCÊNCIA E INGENUIDADE DE UM PERSONAGEM

O PAGADOR DE PROMESSAS – PALMA DE OURO QUE ELE MERECE! INOCÊNCIA E INGENUIDADE DE UM PERSONAGEM

Data:

(!) Por TJGuimarães

O embate entre a crença popular e a arrogância da igreja com suas “verdades” absolutas

O Pagador de Promessas foi o único filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro do Festival de Cinema em Cannes, Paris, em 1962. Também conquistou outros inúmeros prêmios e uma indicação para o Oscar em 1963, no qual concorreu como melhor filme estrangeiro.

O filme é baseado em uma peça homônima de Dias Gomes. Foi adaptado e dirigido por Anselmo Duarte. Têm no elenco, grandes atores daquela época, como Leonardo Villar, Glória Menezes, Dionizio de Azevedo, Othon Bastos, Norma Bengel e outros. As filmagens foram realizadas em Salvador, capital da Bahia.

A trama – tentativa de concretizar o cumprimento de uma promessa concebida em um terreiro de candomblé -, contrapõem a ignorância do povo simples e humilde e a arrogância e intolerância da igreja na questão do sincretismo religioso que ocorre em todo o Brasil.

Dias Gomes – romancista, contista, dramaturgo, teatrólogo -, soteropolitano e “imortal” desde 1991 da cadeira 21 – sucedeu a Adonias Filho. A peça O pagador de Promessas foi escrito em 1959 e estreou no TBC, em São Paulo com direção de Flávio Rangel e Leonardo Vilar no papel principal. Com ela Dias Gomes ganhou projeção mundial, sendo a mesma traduzida para inúmeros idiomas e foi encenada em todas as partes do globo. Poucas obras, no Brasil, foram tão premiadas quanto esta, que entre outros prêmios, recebeu o Prêmio Nacional de Teatro; Prêmio Governador do Estado de São Paulo; Prêmio Padre Ventura; Prêmio Melhor Autor Brasileiro e Prêmio Governador do Estado da Guanabara. Outras produções de Dias Gomes foram premiadas em sua especialidade.

Anselmo Duarte – Paulista de Salto. Ator, diretor, roteirista e produtor. Dirigiu 11 filmes, atuou em 31, escreveu 9 roteiros originais e 8 roteiros adaptados. O seu trabalho como ator o transformou no maior galã de seu tempo, com dramas, musicais e comédias românticas que marcaram as décadas de 40, 50 e 60.

Seu primeiro roteiro foi o clássico “Carnaval de Fogo”, de 1948. Em 1958, foi sua estreia como diretor em “Absolutamente Certo”, uma comédia musical que surpreendeu a crítica, obtendo aceitação e aplausos do público. Em seguida, estabeleceu-se na Europa em trabalhos como ator na Espanha e em Portugal, retornando ao Brasil, em 1961.

A história é bem brasileira. Zé do burro era um homem muito simples, vivia em companhia de sua mulher e de seu animal, um burro – “Nicolau, tinha alma de gente” – por quem tinha muito apreço. Ele era um homem do sertão, lá do serrado, lá do interior do mato, da caatinga, do roçado. Certa ocasião o animal caiu enfermo e Zé-do-burro, ao ver a situação do animal, ficou muito agoniado. Fez então uma promessa à Santa Bárbara, prometeu que dividiria suas terras entre os necessitados e carregaria uma cruz tão pesada quanto à de Jesus até à igreja da Santa. Como em sua cidade não havia tal igreja, ele tratou de fazer a promessa em um terreiro de candomblé, onde ela é conhecida pelo nome de Iansan. Saiu de sua terra no interior da Bahia carregando uma cruz e, junto ia sua esposa rumo a Salvador onde tinha e ainda tem a tal igreja. Mas, por se tratar de um burro, o padre local não aceita o pagamento da promessa. Um caloroso confronto com a Polícia tem início quando se tenta impedir à força a entrada de Zé-do-burro na Igreja. E a trama caminha para um desfecho trágico, contribuindo para transformar esta produção em um clássico do cinema brasileiro.

 

A trama tem propósitos de evidenciar as questões socioculturais da vida cotidiana brasileira, quando aborda a questão da arrogância, intolerância e prepotência da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre e na insensibilidade do Monsenhor convocado para resolver a questão entre um representante da igreja e um do povo, expondo às claras a reafirmação do pretenso monopólio religioso exercido pela Igreja Católica.

O despreparo e incapacidade das autoridades representantes do Estado – a polícia -, de lidar com questões mais complexas e multiculturais, transformando um caso de diferenças sócio-político-culturais em um mero caso de polícia.

A voracidade inescrupulosa da imprensa irresponsável e oportunista, simbolizada no repórter – símbolo máximo do mau-caratismo -, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão midiática e venda que a história pode render, ao transformar sua promessa de dar a terra aos pobres, em grito pela reforma agrária.

Evidencia a distância que separava e ainda separa o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro, como símbolo do povo simples, humilde e ignorante de todos os assuntos, não consegue ou tem dificuldade de compreender por que lhe tentam impedir que cumprisse a sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa e muitos outros da “cidade grande”, não conseguem compreender quem é Zé do Burro, o pagador de promessa, com sua origem ingênua e com outros códigos culturais e outras posturas diferentes dos “citadinos”.

Ademais, a trama evidencia as mais variadas facetas populares: o gigolô esperto, a prostituta, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas, etc. A entrada “triunfal” dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo inerte, sinaliza para a inutilidade daquela morte – afinal, morreu pra quê?

 

Premiações obtidas pelo filme e curiosidades

Palma de Ouro no Festival de Cannes, França (Melhor longa-metragem), 1962;

A ideia do filme começou numa noite quente do verão de 1961, quando Anselmo Duarte foi ao TBC assistir à peça de Dias Gomes, encenada por Flávio Rangel, com Leonardo Vilar e Natália Timberg nos papéis principais;

Para obter os direitos de filmagem, Anselmo Duarte teve de vencer a resistência do teatrólogo Dias Gomes, que relutava em ceder seu texto ao diretor de apenas um filme, “Absolutamente certo”. Um êxito popular de bilheteria. Além disso, disputou o texto com um consagrado diretor de teatro: Flávio Rangel;

Os direitos de adaptação foram comprados por 400 cruzeiros, o preço mais alto até então pago por uma adaptação brasileira. O filme custou apenas 20 milhões;

Odete Lara foi a primeira atriz convidada por Anselmo Duarte para um dos principais papéis femininos do filme. Por motivos contratuais, não pôde participar e, mais tarde, se arrependeu amargamente;

O Pagador de Promessas foi exibido na Casa Branca, em 17/12/1962 e foi entusiasticamente aplaudido pelo presidente Kennedy, diplomatas e jornalistas;

Quando o filme O Pagador de Promessas ganhou Palma de Ouro, teve que lutar contra muito mais que outros filmes. O Embaixador em Paris e o Itamaraty não acreditavam na capacidade do cinema brasileiro. O filme venceu oito concorrentes na comissão de seleção de filmes do Itamaraty, foi selecionado. Mas o pessoal do Rio de Janeiro não sabia que em Paris o nosso Embaixador era tão contrário, a ponto de não emprestar a bandeira do Brasil para o festival;

Glauber Rocha foi de grande importância para O Pagador de Promessas, pois ele apresentou Anselmo Duarte ao prefeito, que era o Antônio Carlos Magalhães – Toninho Malvadeza -. Foi ele que arrumou o Corpo de Bombeiros para as filmagens, também foi assistente de produção;

Após o recebimento do prêmio em Cannes, o diretor e a equipe do filme que viajaram até o Festival foram recebidos com um desfile público em carro aberto, ao desembarcar no Brasil, tamanha foi a repercussão e a importância do prêmio.

O filme, O Pagador de Promessas, pode ser apreciado no LINK que segue: http://www.youtube.com/watch?v=u7j0Jkq2eeg

 

(!) Historiador, Jornalista, Professor de História/Geografia/Filosofia/Sociologia

 

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