CACHAÇA – DE SUBPRODUTO DO AÇÚCAR A MOEDA DE TROCA E IDENTIDADE NACIONAL

CACHAÇA – DE SUBPRODUTO DO AÇÚCAR A MOEDA DE TROCA E IDENTIDADE NACIONAL

Data:

(!) TJGuimarães

13 de setembro, Dia Nacional da Cachaça

O dia da cachaça se avizinha e, nada melhor para comemorar esse dia com um pingo de história sobre essa bebida tão popular e consumida em nosso Brasil.

Esse dia foi criado em 2009 pelo Instituto Brasileiro da Cachaça (IBC) em alusão a esse dia no ano de 1661 quando ela foi oficialmente liberada para a produção e comercialização no Brasil pela rainha consorte de Portugal e Algarves, Luísa de Gusmão.

Existem muitas histórias pitorescas e criativas quanto ao marco zero da cachaça em terras brasilianas. Não há um registro preciso sobre o verdadeiro local onde a primeira destilação da cachaça foi iniciada.

O certo é que a sua história econômica e sociológica se confunde com a História do Brasil, tendo como protagonistas a cana-de-açúcar, o grande latifúndio – no caso o engenho -, inicialmente os colonizadores europeus, o local (índio) e o escravo africano, que juntos, criaram o primeiro destilado das Américas. Existem controvérsias, mas, pelo fato de Martim Afonso de Souza ter chefiado a primeira expedição colonizadora do Brasil, fundado a Vila de São Vicente em 1532 e em seguida iniciado o cultivo da cana-de-açúcar e a construção de engenhos, a historiografia registra e defende a tese de que a produção da aguardente foi feita pela primeira nesta Capitania – de São Vicente.

É notório que a sua origem foi mistificada em lendas como a do melado esquecido no fogo e depois escondido do feitor, que fermentou e, após evaporar, condensou-se no teto do engenho e gotejou, dando origem à denominação de “pinga”. Pior ainda é outra história que afirma ser o termo “aguardente”, advindo de uma suposta ardência do líquido em contato com as feridas nas costas do escravo vítima do látego, quando se sabe que a expressão latina aqua vitae era de largo uso em todo o mundo latino ainda no Império Romano. De todo modo, a cachaça se firmou muito rapidamente no gosto popular dos índios, africanos e portugueses de estirpes populares ou degredados, que formaram os primeiros núcleos de povoamento nas terras brasileiras. Era barata, sendo feita com uma pequena parcela do caldo, ou melado, derivados da cana farta nas grandes plantações e, de relativa facilidade na sua produção. Enquanto os fidalgos se entregavam ao vinho e à bagaceira portuguesa, o povo, advindo das três etnias se consolava com a cachaça enquanto da formação da nação brasileira.

Aguardente é qualquer bebida que tenha sido obtida a partir da fermentação de vegetais doces, como frutas. Sua graduação alcoólica está entre 38 e 54%. Portanto, é possível fabricar aguardentes através de frutas, cereais e também raízes. Já a cachaça, é a aguardente da cana-de-açúcar. Sendo assim, toda cachaça é uma aguardente, mas nem toda aguardente é cachaça. Em resumo; a cachaça é o destilado feito do caldo da cana de açúcar com graduação alcoólica entre 38 e 48%, não podendo conter açúcar acima de 6 (seis) gramas/litro. Portanto, o que fugir destes parâmetros, é aguardente.

A cachaça permeia toda a História do Brasil, surgindo como consequência do interesse do açúcar pelo mercado consumidor mundial. Além dessa relação, a cachaça foi e é agente passivo e ativo de muitos acontecimentos, desde momentos tristes às celebrações por conquistas. Às vezes, sua produção foi estimulada, outras vezes foi proibida, mas sempre esteve presente na construção da nossa identidade. Foi utilizada como importante moeda de troca nas relações com os traficantes de escravos africanos em decorrência de sua utilização como complementação alimentar. Sem cachaça, não haveria escravo.

Denota-se daí, a sua importância permeando todas as nossas relações desde os primórdios do Brasil Colonial. É cantada em verso e prosa. Deificada e demonizada conforme a conveniência de cada um, tanto no amor quanto no ódio. Está presente em todas as manifestações culturais, tanto nos rituais sagrados quanto nos profanos, bem como nos rituais sincréticos.

A título de exemplo da importância da cachaça no cenário musical brasileiro; dois clássicos da cachaça permearam gerações na sua apreciação, sendo o primeiro; a Marvada Pinga ou Moda da Pinga, composição de Ochelsis Laureando; canta Inezita Barroso: “Com a marvada pinga / É que eu me atrapaio / Eu entro na venda e já dou meu taio / Pego no copo e dali num saio / Ali memo eu bebo / Ali memo eu caio / Só pra carregar é que eu dô trabaio / Oi lá.”.  O outro clássico da música e ao mesmo tempo do cinema é O Ébrio, composição e cantoria de Vicente Celestino: “Tornei-me um ébrio e na bebida busco esquecer / Aquela ingrata que eu amava e que me abandonou. / Apedrejado pelas ruas vivo a sofrer. / Não tenho lar e nem parentes, tudo terminou…”.

Ela, a cachaça, desde o seu início, absorve uma grande quantidade de pessoas na sua cadeia produtiva. Foi e é modelo de sociedade – para o bem ou para o mal -, afinal, o engenho como complexo produtivo, abrigava e ainda abriga a atividade fabril, pastoril, habitacional e social. Hoje é fator de retorno e fixação do homem no campo já que a grande maioria dos envolvidos no processo é de pequenos e médios produtores de cana-de-açúcar e proprietários de alambiques, bem como a mão de obra paga. Tudo isto não nos pode fazer com que esqueçamos os dissabores e mazelas das condições de escravidão e servidão desumanas na sua origem, bem como ocorre hoje nas grandes indústrias agropastoris no concernente ao aliciamento dos trabalhadores da cana e seus produtos apesar de todos os esforços envidados pelos órgãos reguladores no sentido de abolir tais práticas. 

A CACHAÇA permeia todos os estratos econômicos, políticos e sociais do Brasil. É identidade nacional, moeda de troca e o mais brasileiro dos prazeres. A bebida destilada mais consumida no Brasil e a terceira no mundo. É impossível pensar os ciclos econômicos ocorridos no Brasil, principalmente os do ciclo do açúcar, do ouro e do café, sem a presença e o consumo da cachaça. Nos livros; “História da Alimentação no Brasil”, de Luís Câmara Cascudo e “Açúcar”, de Gilberto Freyre, se sugere que ela sempre foi o maior “mata-fome” do Brasil, fazendo com que a população mais desfavorecida esquecesse que o estômago roncava, seguindo assim com o trabalho de sol a sol. Ainda hoje, ela é um importante componente na “dieta” alimentar. Ela, o “Mata-bicho”, entra no café da manhã, no almoço, na merenda e no jantar. Para o seu consumo as desculpas são as mais diferentes possíveis; para esquentar, para esfriar, para esquecer, para lembrar, para amar, para odiar, para alegrar…

 

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(!) Historiador, Jornalista, professor de História/Geografia/Sociologia

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